Depois de algumas mentiras durante o dia, haja a esperar mais uma hora para o eclipse que disseram no jornal que iria acontecer. Nunca viu um na vida por pura preguiça e medo de se envolver com a natureza e acabar de apaixonando. Nunca gostou de mar nem de sol nem árvores. "Que bom que elas respiram", era tudo o que dizia sobre isso.
- E a sua juventude? - alguém, um dia, perguntou.
- Fiz tanta coisa. - ousou a mentir. É de dar dó porque o seu coraçãozinho - rígido, duro e frio - se estremece ao lembrar do passado sem água na boca.
Mas se perguntarem, ela não acredita em arrependimento. Nada de chorar pelo passado, nada de pensar como ele poderia ter sido diferente. Lamentar é pra gente com falta do que fazer. Falta de álcool pra acabar com o fígado e com as durezas da vida.
Sempre esteve perto de morrer - afinal, todos estamos, por isso nunca teve medo da morte. Destemida, ela não ia praticar esportes radicais nem dançar até o raiar do dia. Destemida, ela se guardava, planejava, planejava e acabou vendo a vida passar.
Os netos quase não a visitam e a filha mais nova mora do outro lado do mundo em um país que ela não sabe o nome. Conta pra todo mundo que fala com ela por vídeo pelo computador, mas já tem alguns meses que só recebe algumas mensagens no estilo "Tô viva, mãe".
No fundo, existe uma partezinha dela que deseja um rumo diferente pro agora. Mas ela nem faz nada por isso. Mas quando encontra Maria Rita no corredor do prédio, diz com carinho: aproveite a vida como você quiser. Faça ela do jeito que quiser, minha jovem. E aceite o amor, venha como vier.
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